Camisa 12: cinquenta anos de apoio ao Inter
- entrelinhascolorad
- Oct 17, 2019
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Essa é a história de uma paixão que atravessa gerações. Do grito de despertar do Gigante. Uma síntese da união entre o Clube do Povo e o carnaval. Se o ontem foi de festa, o hoje é de ambição, de um povo que sabe que sempre estará junto do Colorado. Afinal de contas, imaginar o Inter sem sua mais antiga torcida é o mesmo que conceber nosso vermelho sem o branco. E branco, quem veste, é a 12. Fazendo jus ao lema “Ontem, Hoje e Sempre”, a Camisa 12 completa nada mais nada menos do que 50 anos neste sábado (12/10), e recebe aqui uma justa homenagem pelo apoio incondicional ao Internacional durante todos esses anos.
O ano era 1969.

Dentro de campo, o Clube do Povo procurava se reestruturar para retomar a senda de vitórias dos gloriosos anos do Rolo Compressor. Valdomiro, Claudiomiro, Bibiano Pontes, Bráulio, Dorinho.. parece poesia para os ouvidos colorados. Nomes de uma geração promissora que surgia do Celeiro de Ases e que seria base de uma década vermelha. O Colorado se preparava para dominar o Brasil.
Embora a equipe fosse de alta qualidade, seria necessário um ingrediente especial para a Academia do Povo derrubar os poderosos times do eixo Rio-São Paulo. Afinal, havia batido na trave nas edições de 1967 e 68 da Taça Robertão. E foi aí que surgiu a cereja do bolo. Imponente e majestoso, o Beira-Rio foi inaugurado no dia 6 de abril de 1969, marcando uma nova era para o Internacional. Poucos meses depois, precisamente no dia 12 de outubro daquele ano, Vicente Rao, Hernani Becker, Jorge Birolho e Victor Tavares do Santos fundavam a Camisa 12, primeira torcida organizada do Clube e uma das primeiras do país, dando voz aos primeiros gritos de um Gigante recém-nascido.
Atual vice-presidente da torcida, Carlos Augusto Moisés, 65 anos, viu tudo isso de perto:
“Já existia um prenúncio da torcida nos Eucaliptos. Quando o Internacional veio para o Beira-Rio, aquela torcida que existia veio para cá. Na época, surgiu a ideia de criar o décimo segundo jogador, então veio a Camisa 12. A gente foi crescendo, o pessoal foi vendo uma nova maneira de torcer, em um outro tipo de estádio“, conta. “Foi uma inovação aqui no sul do país”.
O efeito foi imediato e, já em dezembro, o Inter conquistava o Campeonato Gaúcho, dando um ponto final à sequência do maior rival e iniciando outra jamais igualada: o inesquecível octa. Durante a primeira metade da década, enquanto o time colorado amadurecia dentro de campo, o povo colorado começava a chamar atenção do centro do país pela festa e pressão que concedia das arquibancadas. Durante as campanhas vitoriosas do Campeonato Brasileiro de 1975 e 76, a fama já se espalhara pelos quatro cantos do Brasil, fazendo tremer qualquer adversário que ousasse desafiar o Colorado dentro de sua casa.
Capítulo 2: Show nas Arquibancadas

Conforme os anos passavam, a torcida ia crescendo. Entre os anos 1980 e 90, ela se consolidou como a maior do Clube, passando de 150 para 2 mil e 500 componentes cadastrados. Isso se deu principalmente pelo fato de encontrar o seu lugar dentro do Gigante: a arquibancada inferior. Ali, a festa rolava solta e os colorados davam um verdadeiro show a cada partida no Beira-Rio. Na época, Carlos Augusto era o presidente da Camisa 12, e explica como a transição para o andar de baixo do estádio ocorreu quase que por acaso.

Se dentro de campo as vitórias já não eram mais tão costumeiras, fora dele o sucesso era total. A Camisa 12 abocanhava com facilidade as premiações para melhor torcida do Rio Grande do Sul, sendo pioneira em diversos aspectos, como a introdução de instrumentos de sopro em sua charanga e a confecção do primeiro bandeirão visto em terras gaúchas, com cerca de 3.800m².
Capítulo 3: Inter, Samba e Carnaval

Do povo e para o povo, Internacional e o samba têm uma relação íntima desde o surgimento do Clube, sendo o carnaval a primeira fagulha desse relacionamento. Não é a toa que, logo na fundação colorada, em 1909, o antigo Bloco dos Venezianos concedeu as cores que prevalecem na camisa vermelha e branca até hoje.
Mais tarde, o Rei Momo de Porto Alegre, Vicente Rao, começou a levar a festa dos blocos para as arquibancadas dos Eucaliptos, estreitando ainda mais essa ligação. Ainda se pode citar o Baile Vermelho e Branco que balançava o Gigantinho nos anos 1980, levando milhares de foliões ao ginásio colorado.
A parceria entre Camisa 12 e a Imperadores do Samba ajuda a perpetuar essa tradição. A relação das duas permeia o imaginário dos torcedores e a dinastia colorada do samba teve um dos seus pontos mais altos em 2009, quando a escola foi campeã do Carnaval de Porto Alegre tendo o centenário do Clube do Povo como tema. Na avenida, é claro, estava a tradicional ala da organizada, que acompanha a escola desde os anos 1970. O samba é o ritmo do povo, e o samba é o ritmo da 12.
Capítulo 4: Uma Paixão Inexplicáve
Não é comum uma torcida chegar a meio século em atividade. Muitas ficam pelo caminho e terminam em histórias para contar. A Camisa 12 atravessa gerações, passando de pai para filho, de mãe para filha, sendo possível avistar avôs e netos dentro da mesma torcida. Uma paixão que se transformou em tradição, mas que poucos, ou quase ninguém, consegue explicar ao certo de que maneira funciona.
Por vezes, nem todos entendem esse lazer, lamenta Alexandre Jochims, o Magrão, puxador titular da bateria. Ele revela que já perdeu três relacionamentos em função da sua paixão número um. Mas não se arrepende, e adverte que elas já estavam devidamente avisadas sobre a sua principal prioridade: apoiar o Sport Club Internacional onde for.
Esse amor inexplicável pelo Inter e pela Camisa 12 é um padrão dentro dos membros da torcida. Um sentimento que passa de geração para geração e emociona até os mais experientes, que vêem seus descendentes herdarem com mesmo entusiasmo essa paixão arrebatadora. Diretor da organizada, Joca Vitali, 47 anos, revela que seus quatro filhos fazem parte da torcida, e já prepara o terreno para o neto que está por vir.
Membro da Velha Guarda e figura conhecida do Beira-Rio, Flávio Couto é personagem constante na trajetória da Camisa 12. Mesmo depois de milhares de jogos e viagens dando suporte à equipe colorada, ele ainda se emociona ao falar sobre a torcida. Aos 64 anos, em sua maioria dedicados ao Inter, utiliza o auxílio de uma bengala para seguir o Colorado aonde for, seja na fase boa ou na ruim.
Capítulo 5: Além da Arquibancada

O papel da organizada vai muito além das arquibancadas do Gigante ou dos estádios pelo Brasil afora, ultrapassando o futebol e agregando na sociedade. São centenas de ações beneficentes promovidas pela torcida, desde a entrega de mantimentos para entidades de amparo, até ações diretas com moradores de rua e comunidades carentes.
Juntos às demais organizadas do Clube, teve papel determinante na ação junto aos desabrigados em julho deste ano, quando o Clube do Povo acolheu centenas de moradores de rua em uma das noites mais frias dos últimos tempos. Além disso, oferece oficinas de instrumentos musicais e até aulas de artes marciais ao público.
A representatividade também fala alto dentro da torcida, não apenas por reunir diversos torcedores humildes, o chamado ‘povão colorado’. Durante seis anos consecutivos, a Camisa 12 teve uma mulher em sua mais alta liderança, fato raro entre as torcidas de futebol. A torcedora Juliana Coutinho, 39 anos, foi eleita por três vezes seguidas a presidenta da 12. Demonstrando garra e força dobrada, ela ainda dividiu a tarefa de ser mãe e líder da torcida ao mesmo tempo.
Apesar de muitas vezes os torcedores organizados estarem atrelados à violência, lamentavelmente presente nos mais diversos setores da sociedade, a torcida reúne variados tipos de pessoas, garante Joca Vitali. “Tem de tudo, desde trabalhador, pai de família e até padre”, resume. Oriundos dos mais diferentes locais, uma coisa todos têm em comum: a paixão pelo Inter e pela Camisa 12.
Capítulo 6: Cinquenta Anos de Tradição

Ao todo, é a metade de um século ao lado do Inter, ajudando a conquistar três Campeonatos Brasileiros, um deles invicto, uma Copa do Brasil, duas Copas Libertadores, Sul-Americana e até o Mundial de Clubes no Japão, além de dezenas de Campeonatos Estaduais. A Camisa 12 esteve junto com o Inter em todas essas conquistas. Mais do que isso, esteve junto também nas horas ruins, seja onde for. De saldo positivo, além dos títulos, as amizades conquistadas e alimentadas.
Atualmente, a torcida conta com cerca de 1 mil e 300 membros e vem procurando retomar o seu crescimento gradativamente. Um modelo associativo especial é oferecido a quem deseja fazer parte, no qual o torcedor se torna sócio do Clube e da torcida ao mesmo tempo, contribuindo efetivamente para o quadro social e para a organizada de maneira simultânea.
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